Resumo
A
captação e armazenamento de água de chuva é uma prática milenar e no Brasil,
mais recentemente, vem sendo adotada na região semiárida como estratégia de
garantia do direito
à água. A
água de chuva apresenta-se de boa qualidade, inclusive para beber e cozinhar.
Porém, a sua quantidade e qualidade podem ser alteradas devido a diversos
fatores que in-fluenciam na efetividade da tecnologia para fins de
abastecimento de água. No Brasil, as cisternas ganharam maior relevância a
partir de 2003 com a implementação do Programa Um Milhão de Cisterna (P1MC)
pela Articulação do Semiárido Brasileiro (ASA). Esse Programa, que a partir
2011 passou a integrar um programa do Governo Federal, foi resultado de um
conjunto de ações e reivindicações de movimentos sociais que passaram a se
organizar em torno da ASA objetivando garantir o acesso à água de qualidade à
população. O uso das cis-ternas para abastecimento de água humano no semiárido
integra uma estratégia sustentada nos pressupostos da convivência com o
semiárido e das tecnologias sociais, sendo, portanto fruto de vivências e
convivências com a realidade do chamado Brasil profundo e, portanto,
referenciada nas realidades social, política e ambiental local,
caracterizando-se como um mo-vimento importante de ruptura das ações estatais
tradicionalmente voltadas para o território. No entanto, no que pese o
reconhecimento do alcance social desse esforço, que foi traduzido no P1MC, há
também uma série de questões que vêm sendo suscitadas quanto aos resultados das
ações implementadas. No caso do presente estudo, buscou-se avaliar a
efetividade da Tecnologia Social do sistema de captação e armazenamento de água
de chuva (SCAC) para abastecimento humano do P1MC, a partir da realidade de uma
região do semiárido baiano. Para alcançar seu objetivo, o estudo identificou
quais as variáveis que influenciaram na efeti-vidade do uso e funcionamento do
sistema de captação e armazenamento de água de chuva do P1MC para o
abastecimento humano, à luz das tecnologias sociais, no semiárido baiano. A
investigação envolveu o estudo de 445 cisternas do P1MC, em cinco municípios
baianos, com pluviosidade média anual de até 600mm. O desenho do estudo
envolveu o levantamento de dados primários e secundários, segundo as dimensões
analíticas ambiental, técnica, sanitária, social e institucional. Para as
análises dos dados foram utilizadas as técnicas do Diagrama de Paretto, Análise
Fatorial e Construção do Índice de Efetividade. Como resultado principal,
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foi percebido que o SCAC apresenta fragilidades quanto ao atendimento
dos pressupostos da tecnologia social em todas as dimensões estudadas. A
aplicação das técnicas evidenciou que no Diagrama de Paretto menos de 24% das
variáveis estudadas classificaram-se entre precário e regular, enquanto 44%
foram satisfatórias e 32% muito satisfatórias. O Diagrama de Paretto também
indicou que são necessárias ações continuadas de educação sanitária e de
assistência técnica, como também o acompanhamento do Poder Público local já que
este
é o
responsável constitucionalmente pelas ações de saneamento básico e,
consequentemente, de abastecimento de água. O estudo da Análise Fatorial, a
partir do método matriz de correlação policórica, gerou 6 fatores, sendo o
fator 1 o que melhor explica o estudo para o uso e funcionamento da cisterna. O
Fator 1, de maior variância, predominou a presença de variáveis da dimensão
técnica (existência de sangrador com tamponamento na cisterna, desvio das primeiras
águas, distância da cisterna das instalações de esgotos, existência da calha de
captação da água de chuva na cisterna). Por fim, o Índice de Efetividade da
Cis-terna enquadrou a tecnologia estudada entre as categorias crítica e alerta.
No que se refere aos resultados qualitativos, a percepção da comunidade em
relação ao P1MC evidenciou um alto nível de satisfação dos usuários com as
ações do P1MC, já que as cisternas significaram o acesso à água nas
proximidades do domicílio.